Sobre Maria Medianeira na Festa da Dedicação do Latrão

Sermão

Padre Lucas Altmayer, 10/11/2025 09:49

Celebramos hoje a festa da Dedicação da Arquibasílica do Santíssimo Salvador, em Roma, a Basílica Catedral do Santo Padre, a Basílica do Latrão.

Se é sempre oportuno celebrar a festa da Dedicação das Igrejas, sobretudo daquela que é a Mãe e Cabeça de todas as outras, é ainda mais louvável poder exaltar e celebrar Aquela que foi o perfeito Templo de Deus — mais sublime que o Templo de Salomão, mais puro que qualquer sacrário desta terra: a Santíssima Virgem Maria, Arca da Aliança, verdadeiro Templo do Altíssimo.

Os louvores que neste sermão são dirigidos à Virgem Santíssima brotam de um coração sacerdotal desejoso de pregar aos fiéis verdades importantes sobre o papel da Virgem Maria na economia da nossa salvação, e do mais sincero anseio de tributar honra e glória a tão Boa Mãe, tão ultrajada nestes últimos tempos.

É uma honra defender a glória da Santíssima Virgem; é a resposta à súplica tantas vezes repetida na récita do Ofício Divino: Dignare me laudare te, Virgo Sacrata. Da mihi virtutem contra hostes tuos.

                Alguém resolveu, contrariando todo o desenvolvimento católico realizado até aqui, dizer que é temerário, ou seja, perigoso, aplicar à Santíssima Virgem os títulos de Medianeira de todas as graças e Corredentora da humanidade.

Diante disso, devemos, sim, contestar as intenções que estão por detrás dessa resolução e dar muito valor a elas, caso realmente tenham sido ditas pelos autores dessa consideração infeliz e impiedosa.

Por que a invocação da Virgem Maria como Medianeira e Corredentora seria algo perigoso? A que ou a quem representa um perigo? Para a fé católica, essas doutrinas só seriam perigosas se não fossem católicas. Nesse caso, comprometeriam a própria fé e deveriam ser condenadas.

Parece que esta é a intenção principal da doutrina ensinada nesta semana sobre a Mediação de Nossa Senhora e a Corredenção: seriam perigosas para a fé católica, pois seriam sempre inoportunas, confusas e obscureceriam o papel de Nosso Senhor Jesus Cristo na economia da Redenção.

É necessário, portanto, procurar entre os teólogos quais foram aqueles que ensinaram teses erradas a partir da concepção dessas verdades de fé.
Houve algum teólogo que tenha ensinado alguma heresia ou doutrina perigosa sobre a mediação de Nossa Senhora e sobre o seu papel de Corredentora?
Algum Papa, dos muitos Papas que favoreceram a doutrina dessas duas verdades, enganou-se, confundiu os fiéis ou propagou doutrina falsa sobre o papel que Nossa Senhora ocupa no projeto da salvação divina?

Foram apenas títulos devocionais, utilizados de maneira subjetiva pelos Papas, teólogos, santos e devotos? Ou tratou-se realmente do ensino de uma doutrina sólida, cada vez mais desenvolvida e enraizada na Tradição da Igreja?

O ensinamento da Igreja sempre foi favorável, claríssimo, seguro e profundamente católico quanto à doutrina da mediação universal das graças e da Corredenção da humanidade pela Virgem Maria.

Pio IX:

“Assim como Cristo, mediador entre Deus e os homens, assumindo a natureza humana, apagou o escrito do decreto que nos era contrário e o cravou triunfante na cruz, assim também a Santíssima Virgem, unida a Ele por vínculo estreitíssimo e indissolúvel, exercendo com Ele e por Ele suas eternas inimizades contra a serpente venenosa e triunfando plenamente dela, esmagou-lhe a cabeça com o pé imaculado.”
(Bula Ineffabilis Deus, 8 de dezembro de 1854)

Leão XIII:

“A Virgem, isenta da mancha original, escolhida para ser Mãe de Deus e por isso mesmo associada à obra da salvação do gênero humano, goza junto de seu Filho de um favor e de um poder tão grandes que jamais puderam nem poderão obtê-los iguais os homens ou os anjos.” (Supremi Apostolatus, 1º de setembro de 1883)

“Aquela que havia sido cooperadora no mistério da redenção do homem, seria também cooperadora na distribuição das graças que dele derivam.”
(Acta Apostolicae Sedis 28 [1895-1896], pp. 130-131)

 São Pio X:

“A consequência dessa comunhão de sentimentos e sofrimentos entre Maria e Jesus é que Maria mereceu ser a reparadora digníssima do mundo perdido e, por conseguinte, a dispensadora de todos os tesouros que Jesus nos conquistou com sua morte e com seu sangue.” (Ad diem illud, 2 de fevereiro de 1904)

Bento XV:

“Os doutores da Igreja ensinam comumente que a Santíssima Virgem Maria, que parecia ausente da vida pública de Jesus Cristo, estava, no entanto, presente junto a Ele quando caminhava para a morte e foi pregado na cruz — e estava ali por disposição divina.
Com efeito, em comunhão com seu Filho sofredor e agonizante, suportou a dor e quase a morte; abdicou dos direitos maternos sobre seu Filho para alcançar a salvação dos homens; e, para aplacar a justiça divina, tanto quanto dependia dela, imolou o seu Filho, de modo que se pode afirmar, com razão, que ela redimiu o gênero humano com Cristo.
E por essa razão, toda sorte de graças que tiramos do tesouro da redenção nos vem, por assim dizer, das mãos da Virgem Dolorosa.” (Carta Inter Sodalicia, 22 de maio de 1918)

Pio XI:

“Ó Mãe de piedade e de misericórdia, que acompanháveis vosso doce Filho enquanto Ele realizava no altar da cruz a redenção do gênero humano, como nossa Corredentora, associada aos seus sofrimentos... conservai em nós e aumentai cada dia, nós vos pedimos, os preciosos frutos da redenção e da vossa compaixão.”
(Radiomensagem, 28 de abril de 1935)

Pio XII:

“Tendo Deus querido que, na realização da redenção humana, a Santíssima Virgem Maria estivesse inseparavelmente unida a Cristo, de tal modo que nossa salvação é fruto da caridade de Jesus Cristo e de seus padecimentos, intimamente associados ao amor e às dores de sua Mãe, é coisa inteiramente razoável que o povo cristão, que recebeu de Jesus a vida divina por meio de Maria, depois dos devidos homenagens ao Sacratíssimo Coração de Jesus, demonstre também ao Coração amantíssimo da Mãe celestial os correspondentes sentimentos de piedade, amor, ação de graças e reparação.”
(Haurietis Aquas, 15 de maio de 1956).

Como vemos, meus caros, a doutrina da Corredenção, e sobretudo a doutrina de Nossa Senhora como Medianeira de todas as Graças, são perfeitamente católicas — defendidas, louvadas e amplamente propagadas pela Santa Igreja de Cristo. Nunca confundiram, nunca obscureceram a luminosidade da fé católica e jamais serviram de engano para o orbe fiel. O sensus fidei, o senso simples dos fiéis, sempre foi capaz de compreender e acompanhar estas expressões da fé da Igreja.

Confusão, sim, é introduzir pachamamas no Vaticano. Confusão é dizer que a prioridade da Igreja é “cuidar da casa comum”, enquanto se silencia diante de um dos maiores massacres de cristãos no continente africano em tempos modernos. Confusão é o completo silêncio diante da invasão árabe da Europa. Confusão é Amoris Laetitia, Fiducia Supplicans e tantos outros documentos recentes. O chamado “encontro inter-religioso” — isso, sim, é confusão!

Mas então, se estas doutrinas são católicas, por que escrever uma nota dizendo que tais títulos são “inoportunos” e “perigosos”? Por que desencorajar a devoção à Nossa Senhora Medianeira de todas as Graças e Corredentora da humanidade?

São considerados “inoportunos e perigosos” porque são católicos demais. São tidos por inconvenientes porque não nascem das intenções dos que desejam tirar de Nossa Senhora o lugar que Deus mesmo Lhe concedeu. Não esqueçamos: a nota contra a Santíssima Virgem afirma ser fruto de um “particular esforço ecumênico”.

Os modernistas têm uma verdadeira tara por um dos grandes dogmas da religião antropocêntrica: o ecumenismo. Em nome desse ecumenismo, Monsenhor Bugnini produziu a Missa Nova, dizendo ele mesmo: “Minha intenção é remover tudo o que possa representar até mesmo uma sombra de tropeço para os irmãos protestantes.”

Mudaram a Missa porque a Missa antiga era católica demais. Precisavam de uma Missa menos católica. E, pelos mesmos motivos que diminuíram a glória da Santíssima Eucaristia, hoje desencorajam os títulos de Medianeira e Corredentora: porque são doutrinas católicas demais, pouco “ecumênicas”.

Querem que o catolicismo se dilua no protestantismo. Os protestantes não querem ser católicos e, para fazer dar certo o seu “deus ecumenista”, essa gente, que ocupa autoridade dentro da Igreja Católica, quer transformar os católicos em uma espécie de protestantes domesticados.

O ecumenismo de hoje nada mais é do que confirmar os protestantes em seus erros protestantes, enquanto se enfraquecem os católicos naquilo que sustenta a própria fé católica.

Não pouparam a Eucaristia. Não pouparam a doutrina. E não pouparam nem mesmo a Virgem Santíssima!

Não é possível crer no papel de Maria como Medianeira de todas as graças e Corredentora da humanidade e, ao mesmo tempo, ser ecumênico ao estilo moderno, pois o ecumenismo moderno não é católico, mas Nossa Senhora é.

Nossa Senhora destrói o ecumenismo moderno, destrói toda heresia e toda heterodoxia. Estar ao seu lado, defendê-La, é cortar tudo o que nos liga a esse ambiente da religião moderna, em que Deus, Sua Igreja, Seus sacramentos e Sua Mãe não têm o devido lugar.

Honremos Nossa Senhora, defendamo-La sempre! Estar do lado dela é estar ao lado de quem luta no exército que já venceu.

Essas discussões de agora nada têm a ver com as antigas discussões teológicas que precederam a proclamação dos demais dogmas marianos. Hoje, há quem combata essas verdades que a fé católica jamais contestou e o fazem por motivos que não são autênticos. Lutam contra a Igreja de Cristo, a favor da sinagoga de Satanás, das seitas do protestantismo infernal e das demais religiões insensatas dos homens.

Nesta festa em que somos chamados a honrar o templo de Deus, a celebrar a casa do Senhor, lembremo-nos, antes de tudo, da mais augusta casa em que Deus habitou: o seio virginal da Medianeira de todas as graças, a Santíssima Virgem Maria!

Aprendamos, de uma vez por todas, que não se trata apenas de mais uma discussão qualquer entre diferentes pontos de vista teológicos. Trata-se de uma questão de religião,  de professar a fé católica ou de aderir à fé ecumênica; de crer como a Igreja de Cristo sempre nos ensinou ou de crer como creem os inovadores modernos.

Amemos Nossa Senhora, pois “tal é a vontade de Deus, que quis que tenhamos tudo por Maria. Se, pois, temos alguma esperança, alguma graça, algum dom salutar, saibamos que isso nos vem das mãos de Maria.” (São Bernardo)